O Meu Porto Open de Sonho, por Hugo Ribeiro

O Meu Porto Open de Sonho, por Hugo Ribeiro

O ténis é uma das modalidades mais mediáticas a uma escala global e ainda mais quando juntamos os setores feminino e masculino, pois é um dado adquirido que a WTA representa o mais importante e poderoso circuito profissional de todo o Mundo.

Não é por acaso que na lista da Forbes de 2020 das desportistas mais bem pagas do Mundo, as nove primeiras eram tenistas, encabeçadas por Naomi Osaka. A primeira não tenista foi a 10.ª classificada, a futebolista Alex Morgan, com 4,6 milhões de dólares (3,8 milhões de euros), a léguas de distância dos 37,4 milhões de dólares de Osaka (31,5 milhões de euros).

O ténis ultrapassa culturas, fronteiras, credos religiosos, todo o tipo de ideologias, incluindo as políticas, e supera barreiras económicas, pois há muito deixou de ser um feudo de country clubs, para espalhar-se numa rede mundial de infraestruturas públicas onde qualquer um pode jogar.

É uma modalidade que é apresentada como exemplo de inclusão, de tolerância, onde israelitas jogam pares ao lado de muçulmanos, onde desde os anos 80 do século XX um(a) atleta pode assumir-se como parte integrante do que agora sem apelida de LGBT sem que isso implique qualquer estigmatização. Aliás, já se conheceram casos de transsexualidade e casais assumidos entre jogadoras da WTA.

As diversas ocasiões em que as estrelas do ténis uniram-se em jornadas de angariação de fundos para o sismo do Haiti, os incêndios na Austrália e outras catástrofes naturais; as atitudes de jovens campeãs como Osaka e Coco Gauff em defesa do movimento Black Lives Matter; as dnezenas de fundações criadas por tenistas, dos mais aos menos famosos, para ajudarem franjas de população carenciadas, têm também chamado a atenção para uma certa consciência social generalizada da modalidade.

Os grandes eventos de ténis, sobretudo os do Grand Slam, mas também os ATP Masters 1000 e os WTA 1000, são – também por isso – montras e passerelles para todo o tipo de figuras públicas que gostam ou precisam de ser vistas nas extensas transmissões televisivas que esses torneios garantem.

Há uma certa mitologia em redor do ténis que faz com que os poderosos queiram ser vistos ao lado de Serena, Roger, Rafa, Novak e tantos outros. Às vezes, até compram torneios para terem esse privilégio, como fez o magnata da Oracle, Larry Ellison, quando tomou conta do megaevento de Indian Wells, considerado o US Open do Oeste.

E aqueles que não podem acercar-se tanto desses deuses das raquetas, esses comuns mortais como qualquer um de nós, procuram, pelo menos, vê-los ao vivo e partilharem com eles o tempo e o espaço.

É o público anónimo que enche as bancadas, dá cor e ambiente aos torneios, compra equipamentos iguais aos dos seus ídolos, solicita-lhes selfies e estende-lhes as mãos para os cada vez mais anacrónicos autógrafos.

Esse fascínio, essa tentação de ascensão e afirmação social através do ténis, leva hordas de viajantes a algumas das mais icónicas metrópoles do planeta, para assistirem aos torneios e aproveitarem para fazerem igualmente algum turismo em simultâneo.

No meu passado de jornalista, em que viajei pelo circuito profissional de ténis, por quase todos os continentes, apreciei tanto a oportunidade de fazer turismo nos tempos livres, como o privilégio de ver ao vivo os craques das raquetas.

Wimbledon é muito mais atraente por ser em Londres e o mesmo posso dizer de Roland Garros em Paris, do US Open em Nova Iorque e até mesmo do Open da Austrália em Melbourne.

Falando apenas da Europa, onde nos inserimos geograficamente, os circuitos ATP e WTA estão presentes em metrópoles como Berlim, Munique, Estugarda, Hamburgo, Viena, Antuérpia, Sofia, Madrid, Barcelona, Paris, Lyon, Marselha, Budapeste, Roma, Turim, Milão, Roterdão, Praga, Londres, Birmingham, Moscovo, São Petersburgo, Belgrado, Estocolmo, Genebra, Istambul.

Ter um grande torneio de ténis é uma marca quase obrigatória para uma grande cidade europeia, um selo de qualidade e se é certo que os custos organizativos destas competições são elevados, os impactos económicos (diretos e indiretos) nas comunidades locais ascendem a largas dezenas de milhões de euros por ano. No caso dos torneios do Grand Slam vão mesmo para muitas centenas de milhões de euros.

O Estoril Open de João Lagos tinha um orçamento de cinco milhões de euros, o Millennium Estoril Open de João Zilhão, Benno van Veggel e Jorge Mendes ascende aos 3,5 milhões e o Vale do Lobo Grand Champions de Pedro Frazão custava um milhão. Mas veja-se como, segundo uma entrevista de Carlos Carreiras, o presidente da Câmara Municipal de Cascais, só em impacto mediático, o MEO supera os 110 milhões de euros. A título de comparação posso acrescentar, por exemplo, que o mais importante torneio de golfe português, o Portugal Masters, gera um impacto mediático de 65 milhões de euros.

É por isso que, olhando para o mapa europeu, detendo-me em metrópoles com alguma ambição no mercado do turismo global, causa-me sempre estranheza não ver nos calendários competitivos dos circuitos WTA e ATP etapas em Atenas, Lisboa e Porto.

Claro que podemos alegar que o Millennium Estoril Open (MEO) está às portas de Lisboa. É verdade, mas em termos de comunicação, de marketing, de turismo, é o Estoril e Cascais que sobressaem.

Para mim a lógica de organização, de promoção, e até mesmo a estética do MEO (bem como do antigo Estoril Open no Estádio Nacional, em Oeiras), estão mais viradas para um grande evento desportivo numa estância de férias.

Enquadro mais o torneio de ténis mais importante de Portugal no mesmo contexto dos seus congéneres em Umag (Croácia), Bastad (Suécia), Gstaad (Suíça), Kitzbuhel (Áustria), Antalya (Turquia), Marbella (Espanha), Eastbourne (Inglaterra) e, a um nível superlativo, Monte Carlo.

São estâncias de verão ou de inverno, que percebem a importância de mostrar que podem ter torneios de ténis ao ar livre, em alturas do ano que podem coincidir ou não com a sua época alta do turismo.

O torneio do ATP Champions Tour que era organizado em Vale do Lobo, no Algarve, em agosto, sublimava esta coerência teórica.

Quem assistiu à Tennis Masters Cup Lisboa 2000, o maior torneio de ténis jamais realizado em Portugal, percebe seguramente o que desejo sublinhar.

Esse sim, foi um megaevento de ténis com o paladar de uma grande metrópole. Antes e depois do ténis, os espectadores tinham vontade de visitar Lisboa, como acontece, por exemplo, a quem vá ao ATP Masters 1000 de Paris-Bercy ou quem ia às ATP Finals na O2 Arena em Londres.

Quando regresso ao passado e recordo os grandes torneios de ténis portugueses, verifico que o Open de Portugal de 1983 foi no Jamor (Oeiras), o mesmo cenário do Estoril Open (1990-2014).

O Maia Open que integrou o ATP Tour em 1995 e 1996 efetuou-se longe do centro do Porto.

O Estoril Ladies Open que fez parte do circuito WTA em 1989 e em 1990 realizou-se no Cascais Country Club e no Carcavelosténis.

O Vale do Lobo Grand Champions (2001-2010) do ATP Champions Tour tinha sede no Algarve e houve um antepassado português de apenas uma edição nos anos 80 no Cascais Country Club.

A Tennis Masters Cup Lisboa 2000, essa sim, foi no então Pavilhão Atlântico, atual Altice Arena, em pleno Parque das Nações, mas é um evento único, muito provavelmente irrepetível.

O Millennium Estoril Open (desde 2015) situa-se no Clube de Ténis do Estoril, em Cascais.

Perante este cenário, é sempre com nostalgia que recuo a 2001 e 2002, quando a Associação de Ténis do Porto convidou-me a estar presente no Porto Open, que nesses anos integrou o WTA Tour e que teve a sorte e engenho de coroar como campeã, em 2001, uma antiga n.º1 mundial, Arantxa Sanchez.

O Open de Portugal de 1983 consagrou um futuro n.º1 mundial, Mats Wilander.

O atual Millennium Estoril Open ainda não teve essa sorte, mas é possível que Stefanos Tsitsipas venha um dia a liderar a hierarquia do ATP Tour.

O Maia Open e o Estoril Ladies Open nunca conseguiram entronizar um dos n.º1 da história.

A Tennis Masters Cup Lisboa 2000 viveu o cenário perfeito de o título de Guga Kuerten ser acompanhado da automática ascensão ao posto de n.º1 no dia seguinte.

O antigo Estoril Open atribuiu o troféu principal a cinco jogadores que, a dada altura, encabeçaram o ranking do circuito masculino: Carlos Moyà, Juan Carlos Ferrero, Novak Djokovic e depois, uma raridade, vencedores que no preciso dia em que vencera no Jamor eram o n.º1 em vigor: Thomas Muster e Roger Federer.

É nesta elite que se insere o Porto Open, porque Arantxa Sanchez é uma das maiores de sempre na Era Open. É certo que em 2001 estava no crepúsculo da sua carreira, foi aliás, o penúltimo dos seus 29 títulos WTA, mas isso fez com que o significado fosse ainda mais especial… para ela e para nós.

E depois, é inesquecível o facto daquelas edições terem sido jogadas no Monte Aventino, com um sabor, um odor, uma luz, tudo genuinamente do Porto, mesmo ali ao lado do tão portuense café Velasquez, já para não falar do… Estádio do Dragão (na altura ainda das Antas).

Louvo o esforço da Associação de Ténis do Porto e dos seus parceiros, nos quais incluem-se a Federação Portuguesa de Ténis, em manter vivo o Porto Open.

Mas, sejamos sinceros, Portugal merece que uma das suas duas metrópoles apostem no ténis de altíssimo nível. Lisboa está praticamente fora do baralho, porque o MEO está muito bem entregue a Cascais e seca tudo à sua volta.

A melhor solução seria o Porto, mas, para isso, é preciso que haja uma autarquia arrojada (como a de Cascais), associada a uma iniciativa privada com visão (como tem sido o Millennium bcp), e a contribuição ainda do Turismo de Portugal. O Porto poderia e deveria dar uma lição ao resto do país e copiar o que se vê pela Europa fora.

Numa altura em caminho a passos largos para a terceira idade, adoraria testemunhar ainda o regresso de um dos grandes circuitos à cidade do Porto.

O ATP Tour parece-me difícil e desnecessário. O MEO cumpre plenamente a sua função e Portugal precisa é de mais de torneios do ATP Challenger Tour, como é o atual Porto Open.

Eu apostaria mais no regresso do circuito WTA ou, porque não, no ATP Champions Tour.

Já imaginaram a festa do ténis que seria – e o impacto mediático – de um Porto Open que acolhesse em simultâneo, ao longo de uma quinzena, uma competição feminina do ITF World Tennis Tour, uma prova masculina do ATP Challenger Tour e ainda uma etapa do ATP Champions Tour, com algumas das velhas glórias da história da modalidade a apadrinharem as (e os) profissionais mais jovens?

Hugo Ribeiro

(Comentador de ténis no Eurosport e na Eleven Sports)

Texto escrito conforme o Acordo Ortográfico – convertido pelo Lince.        

 

 

Eupago Porto Open  é a prova internacional de ténis da cidade do Porto, inscrita nos circuitos profissionais ITF World Tennis Tour e ATP Challenger Tour,  organizada pela Associação de Ténis do Porto e realizada no Complexo Desportivo Monte Aventino, em parceria com a Federação Portuguesa de Ténis, e com o especial apoio da Ágora - Cultura e Desporto do Porto.
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